MARGRIET TORPSTRA
Prática de Rotterdam
Depois da colisão do Cosco Busan, na Baía de São Francisco [EUA], a questão da comunicação entre prático e comandante voltou a ganhar visibilidade. Capitães e práticos vem se tornando mais conscientes da importância de uma comunicação direta e livre de ambiguidades. E se isto não ocorre, o mundo a seu redor os compele a trabalhar e comunicar-se como uma equipe.
Recentemente, voei de Amsterdam a Estocolmo e pude ver os pilotos e a tripulação do avião a bordo do qual estava encontrando-se pela primeira vez. Estava patente que eles não se conheciam antes.
Os dois profissionais riam, faziam brincadeiras e cumprimentavam-se enquanto a tripulação da cabine estava a apenas um passo de distância. Os pilots acenaram educadamente para eles com a cabeça, mas sem palavras. Porém, no decorrer do voo, pude ouvir por alto a comunicação entre eles e ficou nítido que eles empregavam frases padronizadas -- um resultado de seu extenso treinamento. Eles transmitem e recebem informação sem dar margem a equívocos; sabem exatamente o que fazer e o que esperar uns dos outros. Eles adoram seu trabalho e o modo como trabalham.
Eu me dei conta de que, no passado, um clima como este estava longe de ser comum a bordo. Hierarquia, falta de assertividade e inexistência de delegação eram as bases do cotidiano, mas as consequências disto no voo eram desastrosas.
Frases padronizadas começaram a ser empregadas e procedimentos operacionais padrão foram prescritos; atualmente, todo membro da tripulação conhece seus deveres. Muito treinamento e atitudes simples e transparentes fazem toda a diferença.
Como instrutora de gerenciamento de recursos de passadiço, ouvi com frequência que meus workshops são bons para conscientização mas deixam de dar boas respostas práticas
Na condição de prática, compreendo estas observações.
É possível que tenha chegado a hora de dar uma solução diferente para a dinâmica de cooperação entre práticos, comandantes e tripulação: a padronização das comunicações e da terminologia. É o que fazem VTSs, a indústria aeronáutica e diversas fábricas. Mesmo hospitais adotam esta linha. Para ser honesta, quando eu tiver de ser hospitalizada, minha expectativa é de que médicos e enfermeiras comuniquem-se como equipe e entendam-se com clareza.
Nós -- comandantes, oficiais de quarto e práticos -- podemos trabalhar em melhoras. As instruções podem ser transmitidas de forma facilmente compreensível; checklists podem ser úteis. Do mesmo modo, é possível a treinar a todos os profissionais do transporte marítimo em procedimentos operacionais-padrão
Expresse de forma direta e acurada o que você deseja saber e não presuma nada acerca das intenções da outra parte. Grande parte disto já existe. Deixamos passar módulos simples para aprender a colocar tudo isto em prática.
A questão é: percebemos que trabalhamos melhor no passadiço como equipe ou ainda acreditamos que partilhar dúvidas profissionais é um sinal de fraqueza? Quando a informação não é compartilhada, um erro de uma só pessoa pode ocorrer facilmente.
Em um ambiente favorável a questionamentos e respostas, no qual o comandante contribui com sua responsabilidade pelo navio e o prático, com seu conhecimento local, o trabalho de equipe surge naturalmente através da comunicação simples e eficaz
Temos a capacidade de desenvolver uma Terminologia para Equipes de Passadiço voltada para as atividades habituais de praticagem:
- O prático pode perguntar quem da equipe será responsável pela navegação;
- Um Oficial de Náutica não se rebaixa ao informar sobre embarcações nas proximidades;
- Um prático pode querer ser avisado se um contato estiver a 100 metros ou menos;
- Deve ser uma prática corriqueira traduzir as conversações com o VTS para o passadiço;
- O timoneiro pode receber atenção especial e acompanhamento de um terceiro todo o tempo.
Em resumo, o prático jamais deve trabalhar sozinho -- e então será um profissional benquisto e qualificado, ao invés de um estranho no passadiço.